A dramaturgia da Record, que já viveu dias de glória com produções grandiosas e índices robustos de audiência, parece estar chegando ao fim de um ciclo. Nos bastidores da emissora paulista, os sinais se acumulam e apontam para uma possível decisão estratégica: o encerramento definitivo da produção de novelas. A medida, embora ainda não oficializada, tem ganhado força entre os profissionais do setor e levanta reflexões sobre o novo perfil da emissora no mercado televisivo.
Durante os anos 2000 e 2010, a Record investiu pesado para se consolidar como segunda maior produtora de teledramaturgia do país, atrás apenas da Globo. Foram anos marcados por novelas bíblicas de grande orçamento, estúdios modernos e elencos de peso. “Os Dez Mandamentos”, por exemplo, alcançou repercussão internacional e se tornou um marco da emissora. No entanto, o cenário atual é diferente. Cortes de orçamento, demissões em áreas técnicas e a ausência de novos projetos em desenvolvimento têm sugerido uma mudança de rota.
Profissionais ligados ao RecNov — o complexo de estúdios da emissora no Rio de Janeiro — relatam que a movimentação por lá caiu drasticamente. Sem elenco fixo contratado e com os estúdios praticamente ociosos, a estrutura milionária que antes pulsava com gravações simultâneas agora vive um silêncio inquietante. A dúvida que paira no ar é se a emissora está apenas em um hiato estratégico ou se realmente decidiu abandonar o gênero que, por tanto tempo, foi uma de suas apostas de identidade.
Essa transição reflete uma transformação mais ampla no consumo de conteúdo. As novelas diárias, que exigem longas jornadas de produção e investimentos altos, têm perdido espaço para formatos mais enxutos, como realities, programas de variedades e séries sob demanda. Em paralelo, o streaming também desafia as emissoras tradicionais, oferecendo opções sob medida para um público cada vez mais fragmentado.
Na Record, programas como “A Fazenda”, “Domingo Espetacular” e conteúdos religiosos têm ocupado o espaço nobre da programação, refletindo o reposicionamento editorial da casa. A ausência de chamadas, elenco em divulgação ou cronogramas de novas novelas no horizonte reforça a percepção de que a emissora estaria colocando um ponto final, ainda que discreto, nessa trajetória.
Para o público fiel da teledramaturgia da Record, a possibilidade de um adeus definitivo é melancólica. Muitas das produções da casa ajudaram a formar uma nova geração de telespectadores e revelaram talentos hoje consagrados. Se a decisão se confirmar, a televisão brasileira perde uma importante vertente de pluralidade criativa — e o mercado audiovisual mais uma janela de oportunidades.
O tempo dirá se trata-se de uma pausa prolongada ou de um capítulo final. Por ora, o silêncio dos estúdios diz mais do que qualquer comunicado oficial.